terça-feira, 31 de maio de 2011

Bailarina

Como se fosse uma rede... Ao ler a Paula e Samaryna, pensei em postar este texto.


Ah, as cartas que me escrevias! Lembrei daquele bilhete que encontrei na ponta de minha sapatilha branca onde, em papel amassado, dizias: Te amo, bailarina! Sempre me chamavas de bailarina. Dançávamos muito, é verdade. A música e a dança nos aproximou. Quando tocavas Ballade pour Adeline no piano eu me derretia de amores por você. Nossos passos eram um só. E eu sempre dançava na ponta dos pés. Adorava, e a sapatilha dava-me o conforto necessário para precisar a cadência do ritmo que nos embalava. Amava-a e, assim como Audrey, nunca deixei de usá-la. Ainda hoje gosto e tenho uma coleção de sapatos bailarina, quase todas alvas. Ai... Continuo uma romântica incurável! Dizias que eu era parecida com uma libélula pela leveza de meu corpo e que com as asa transparentes, eu seria capaz, assim como ela, dançar em cima das águas de um algo. Muitas vezes, eu usava vestidos rodados. Lembras daquele azul celeste que era feito de saias duplas, e a de baixo, feito uma anágua, era mais longa do que a de cima e deixava aparecer um bordado branco, lembras? Era um vestido feito para dançar. Recordas que um dia, num baile, o dono veio falar conosco? Perguntou se não poderíamos vir sempre para iniciar o baile e, dessa maneira, encorajar os outros visitantes para dançar. Rimos muito.

Tudo era poesia entre nós. Amava teus olhos, teu cabelo comprido e tuas mãos de pianista. Íamos para a sessão de arte do cinema, sempre nas sextas feiras, e eu adorava teu jeito capixaba de falar: Menina! Me ensinaste que toda canção realmente linda é também um pouco triste. E a bailarina de outrora ainda hoje... adora dançar.


Imagem deviantart

domingo, 29 de maio de 2011

Receitinhas

Um ensaio para a criança que existe em cada um de nós...

As bruxas, de vez em quando, se reúnem para inventar receitas deliciosas. Fazem bolos sorridentes, por exemplo, e geléias cor-de-rosas. A brincar... mexericando, as bruxas vão cozinhando. Preparam incontáveis manjares como molhos, suflês e tantos mimosos petiscos... Tem suspiros também... Ah! E pudins mexediços.

As bruxas adoram feiras e fazem suas receitas caseiras. Compram alcachofras e aspargos, cerejas e ingás amargos. Enchem os cestos com berinjelas, escarolas, espinafre, abacates e carambolas. Imagine, as feiticeiras mesclam frutas, temperos e poções de licores. Adicionam um punhado de flores. Hum! Que aromas... que sabores! Lá vai, pois, uma pitada de sal no arroz carreteiro, um pozinho de estrelas nos doces brigadeiros.

A bruxa Moleca prepara saladas e uma gostosa panqueca. Com um toque da varinha: Uga! Uga! Espertinha! Ela faz também... a torta Fada Madrinha. Oba! Viva! Depois de pronta, Moleca serve a torta para todas as outras fadinhas. O entusiasmo foi geral e todo mundo repetiu: - Oh! Quero mais um bocadinho... dessa torta gostosinha! E aí, céus!!! Aconteceu algo extraordinário. Veja, o que é isto? Que bagunça, que feitiço! As feiticeiras... Que loucura! Fazem a maior bagunça e mil diabruras. Credo! Será que se esqueceram de toda sua finura?

E lá vem a Bruxa Superiora... ai... com varinha e vassoura. E então pergunta: Que torta é esta, bruxinha sapeca? Qual é a mistura? Me diga, qual é a fórmula de tanta gostosura? Moleca, que aventura! Minha nossa! Você errou a receita, menina.

O que você fez... foi a TORTA TRAVESSURA! E agora, Moleca!


Imagem, via

terça-feira, 24 de maio de 2011

Inesperada separação


És azul-parda. Silenciosa, evoluída e linda. Eu te trato com muito carinho. És veloz, leve e elegante, design dinamarquês. Tens um cesto na frente, onde posso colocar as compras, um buquê de flores ou um livro. Nós nos entendemos perfeitamente, tu e eu! Na verdade, foi amor a primeira vista. Foi! Quando te vi, não pude resistir: Te quero, falei. Me dás uma sensação de liberdade indescritível. Hoje... depois da chuva, nós duas saímos juntas, assim como de costume. Fomos ao supermercado. Andamos tranquilamente pelas ruas e tu te deixavas guiar fiel e companheira, como sempre. Deixei-te do lado de fora. Entrei no supermercado feliz da vida. Fiz as comprinhas. Ao sair, com passos apressados e com a mochila carregada, vim ao teu encontro. Olhei e não te vi. Onde estarias? Onde mesmo eu havia te deixado? Não estavas mais no estacionamento! Te lavaram embora. Te levaram de mim... Saí para caminhar com as compras. Andei e senti um vazio, pois não estava preparada para despedidas. Agora estás nas mãos de alguém outro... Que coisa! Tomara que te cuidem, assim... como o mesmo carinho que eu te dei. Quem sabe, um dia... te vejo novamente por aí. Então...

Eras azul-parda. Eras veloz, leve e elegante...

Querida bicicleta! Te roubaram de mim!

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Volumes


Na minha de sala de escrever tem duas janelas: são os meus olhos para o frescor dos dias, para meus sonhos, para meus pensamentos, para minhas esperas. Muitas vezes fico parada diante delas e observo a vida cotidiana das pessoas que moram nas casas – casas de mãos dadas. Se abro as vidraças, o perfume das flores penetra em todo o ambiente. Na minha sala de escrever procuro por palavras... Sim, sou uma eterna procuradora de palavras. Há também livros aqui. Muitos são de escritores brasileiros, e outros. São como safiras para mim, há uma infinita preciosidade em cada volume. Estes livros tem histórias, dentro deles e fora deles também. São uma boa companhia e eu sinto que vivem. É um conjunto majestoso de palavras - se eu somasse os títulos todos, encheria algumas páginas. Abro-os e folheio as suas páginas, como quem abre uma casa conhecida. Encontro em seus aposentos o cheiro familiar de seu conteúdo: novelas trágicas, trama de personagens, sagas familiares, percursos melancólicos, episódios de lutas, de epidemias; magia e realidade. Percorro todos os quartos e me deixo cair no sofá macio e confortável de suas admiráveis prosas: que acolhem, que me roubam, que me envolvem. É como se encontrasse um velho amigo que me abraça com carinho, e eu nada preciso dizer. Na minha sala de escrever não estou sozinha. Aqui moram poetas... poetas que brincam com as palavras... nas páginas de meus livros.


Imagem by: libelle

quinta-feira, 12 de maio de 2011

Idioma

Era uma tarde morna e radiante - em tempos de primavera - e eu seguia a caminho do Shopping Center Fields, onde encontraria com minha amiga. Estava descendo as escadas rolantes da estação do metrô no Kongens Nytorv quando encontrei um casal de brasileiros. Ah, imaginem! Conversavam animadamente em português, de modo que não pude resistir: São brasileiros?- Perguntei. Surpresos, me contaram que eram de São Paulo e que estavam conhecendo todos os países da Escandinávia. Queriam saber de mim e eu contei-lhes rapidamente de como e quando havia vindo para esta cidade. Em poucos minutos, soube que se chamavam Júlia e Marcos. A conversa estava só pela metade, quando o trem parou na estação DR Byen/Universidade, onde desceram. Queriam conhecer a nova Casa de Concertos de Copenhague, construída pelo renomado arquiteto Jean Nouvel, uma vez que, Júlia também era arquiteta. Abanaram para mim e eu segui viagem. Acomodei-me novamente em um dos bancos do metrô e tive que sossegar meu coração que, a estas alturas, estava em polvorosa. Que encontro mais agradável eu acabara de ter. E como é bonito o nosso idioma, pensei. Escutá-lo, assim de supetão, é como ouvir uma música que nos toca a alma. Como diz Pessoa: Minha Pátria é a Língua Portuguesa. Por um momento, me senti perdida, enlouquecida de saudades de meu país.

Numa harmoniosa mistura de felicidade e nostalgia, vou cruzando caminhos por este pequeno reinado e, de ilha em ilha, vou pontilhando meus sentimentos. E então... Mais alguém por aqui fala português?

Imagem: Ila

domingo, 1 de maio de 2011

Meu querido blog!


Perdoe o abandono. Tenho estado completamente comigo por estes dias e esse reencontro tomou-me o tempo integral. Ah, tens toda razão, sou por demais egoísta. Sigo meus dias da forma como bem desejo e dispenso a tua adorável companhia, como quem quebra uma flor e joga fora. Sim, isto é doloroso. Mas eu volto, como vês. Volto, e juntos criamos esta casa que procuramos enfeitar para receber a visita dos amigos. Tu estás sempre aqui, aguardando a chegada deles, és a mais honesta das sentinelas, sempre me representando, enquanto que eu fico de amores com as plantas lá no jardim e com os livros que leio no sofá da sala. Algumas vezes tenho escutado teu chamado, mas não te dei ouvidos. É lícito admitir que sou injusta no abandono compungido que realizei. E você, nesse imenso dengo, me deixa sem palavras. Preferia que me punisses, que me lançasses armadilhas e que esbracejasses. Mas o que encontro? Deparo-me tão somente com tua usual e silenciosa fidelidade. Sei que estavas triste, pois encontrei-te em cor sépia, apagado e sem brilho. Em meio a essa crueza imponderável e em substancioso afeto... volto para a ti. Quero novas tertúlias, querido blog, quero o timbre mais agudo e feliz de tua voz. Juntos, você e eu, vamos costurar textos para alegrar os amigos. Sim, os amigos fiéis! Que venham - com o carinho peculiar e único de cada um.. Pois, sem eles, verdadeiramente, inexistimos.