Ouço música. Os instrumentos tangidos rabiscam belíssimos arabescos por todo o silêncio e por todo o espaço. Acordes perfeitos se relacionam e encastelam harmonia em esplêndido concerto. Eu a contemplo. Ora é suave, outras vezes é carregada de fúria. Ou é o meu sentimento.
Perco-me neste andamento sublime e embriago-me com seu compasso, preguiçosamente. Titubeio em um liso véu de sonhos e a minha alma naufraga na voz melodiosa da sinfonia, uma doce voz que entrecruza o instante. Poesia e notas, assim o momento. Meu tempo flutua como uma pipa e se perde ao ritmo ditoso desta serenata. Recordo instantes de felicidade, fugazes, que vão e que vêm, como se fossem minuettos.
A música assemelha-se a uma ninfa que, de longe, vem rodopiar, feito bailarina. Irrequieta, exala uníssonos perfeitos entre pianos e pianíssimos. Brinca e borboleteia. Dança sem parar, sempre radiante em sua cadência. Arquejante, parece que vai desprover em sua própria formosura. Mais perto, ela se torna possessiva e poderosa, fortíssima, mas terna. No âmago de sua linguagem há um vestígio de aspereza, que me ordena de forma impetuosa, e me orienta. Com violoncelos e contrabaixos adquire textura, retumba aos meus ouvidos e clama que eu vá, deliberadamente. Em ritmo crescente, a música toma um pouco de mim, rouba uma parcela do que sou. Ela me emociona e me entristece. Vigorosa, esmaga meus sentimentos e alastra-me. Manipula de forma quase atroz, desamparando-me. Sinto apenas um resquício do que de mim sobrou. Estou impessoal, desvencilhada. Depois, novamente calma e tão somente alegre, a orquestra me afaga, ao som de violas e violinos. Embala-me, agora com leveza, e me encanta com sua majestade... E, em seu andante gracioso, devolve-me. Uma pequena Serenata Noturna. Mozart.
Texto já publicado anteriormente no Baú e no Jornal NH
16 comentários:
Oi Ilaine, este texto não lembro de ter lido, mas aqui ouvindo uma canção de outro blog e comentando , a emoçao tem aflorado, é que me afaga este som da música do filme "O gladiador" como você mesmo disse...rouba uma parcela de mim, a ainda acrescento...de forma plena e consentida...
Um abraço na alma...bom domingo de dia dos pais para você e sua família
Ilaine eu sempre ouço música e invariavelmente me emociono ouvindo Arabesque de Debussy e amo a obra de Mozart, Bach, Corelli, Chopin, Betoven, Shubbert e tantos outros...
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Música assim como poesia abrem portas, janela e a própria alma.
Belíssimo texto, querida.
Fica bem.
Bom final de semana.
Eu tb sinto. Mas convalesço de cirurgia e não posso (não devo
rsrsrs) vir teclar.
Abraço fra/terno.
Linda, linda!Doce Ilaine das palavras que flutuam em nós como bolhas de alegrias. Feliz estou, de que qdo desenho é sempre pra alguém, penso sempre que alguém vai ver e se encantar, e não imaginas como isso me deixa emocionada, é o meu mais caro prêmio! É para uma criatura doce e sensível, como vc, que desenho e vou te levar comigo para SC e sempre que puder!
Beijos carinhosos
Que coisa mais linda! Viajei!
O seu blog é maravilhoso. Sempre que venho aqui é como dar um mergulho na natureza, na poesia.
Você é genial! Parabéns!
Um abraço bem brasileiro para você!
Josselene - Mossoró/RN/Brasil.
Uma boa melodia embriaga e embevece a alma de qualquer um. Ouví-la é encantar-se em meio à fascinação.
Poético abraço de Gilbamar.
Bem,eu sempre volto quando algome toca e aqui a música e tudo tocou-me.
Abraços,
Nossa, que melodia linda esse texto produziu! Adorei!
Beijo!
Ilaine. A descrição dos momentos musicais penetrando e modificando o seu corpo físico, como se a música tivesse densidade e formas, e texturas. É assim mesmo. Quem tem sensibilidade, percebe os sons saídos dos instrumentos, diferenciados, em cada cadência e ritmo, como se eles "criassem" atitudes, gestos, ações e climas, para nós.
Enxergam-se desenhos feitos pelos sons...uma espécie de sinestesia, não?
Lindo texto!
Meu beijo.
Dora
Olá,Ilaine!
Que magia incrível, não é mesmo?!
A música tem esta propridade. E o modo como você descreveu, nos fez sentir o mesmo.
Amo música...a boa música. É uma terapia.
Aqui, além da audição, despertaram-se todos os outros sentidos.
Adorei!
Muita paz! Beijosssssssss
Ilaine, amiga,
aos poucos vou melhorando. Ainda muito dolorida e edemaciada, a incisão. Aguardo resultado de exames, serenamente. Espero que tudo seja bom.
Estou voltando ao trabalho (considero o meu blogue como um trabalho, pois só nele divulgo minha obra, o livro é muito caro para minhas condições) e tentando postar minhas leituras, idéias e poemas. Mas ainda não posso ficar muito tempo em frente ao PC, o nódulo estava na região inguinal, local que dificulta a locomoção e ficar muito tempo sentado também não convém.
Abraço fra/terno.
A música me transmite sensações que eu nunca senti antes... é nesse amalgama que me encontro e ouço novamente a vida.
Forte Abraço!
Eu sinto imenso prazer em vir te visitar, neste espaço se respira cultura, e gosto muito de ler sobre tudo que escreve.
beijos, tenha uma linda quinta-feira
ilaine, quanto tempo!
como é bom voltar a este espaço.
vasculhei tudo por aqui :)
dê um alô lá no um-sentir. está de cara nova ^^
grande beijo!
Ah, como é bom sentir a música como vc a descreve! Perfeito, seu texto.
Música tem o poder de transformação. E não importa por qto tempo dure os arrepios que possa provocar,né?
Beijo, querida!
Um dia eu escutei o querido e inesquecível Artur da Távola dizer em seu programa "Quem tem medo de música clássica":
...Música é vida interior, quem tem vida interior jamais padecerá de solidão...
Lendo o seu texto, me lembrei dessa frase e acho que você concordará com ele.
Beijos
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