domingo, 10 de janeiro de 2010

Sentir e pensar




"Estrangeiro (e estranho) é quem afirma seu próprio ser no mundo que o cerca. Assim, dá sentido ao mundo, e de certa maneira o domina. Mas o domina tragicamente: não se integra. O cedro é estrangeiro no meu parque. Eu sou estrangeiro na França. O homem é estrangeiro no mundo".
Vilém Flusser

Voltei ontem de viagem do Brasil. Durante quase três semanas enchi os olhos com o verde de minha terra e me alimentei com o carinho inefável que me foi ofertado por todos. Já agora tenho saudades. Ao voltar, há um processo pelo qual preciso passar. De um lado, estou feliz por ter enfrentado a longa viagem e encontrar-me novamente em minha casa, sentindo o seu aconchego e a sua doçura. Por outro, é um vazio que ainda me preenche e que me toma por inteiro. É como se ainda não houvesse realmente chegado. Uma parte de mim está no Brasil, a outra encontra-se já na Dinamarca. Não é tristeza o que sinto, nem tampouco mágoa, pois de uma ou de outra forma, Copenhague é uma espécie de home pra mim. Talvez seja uma dor ainda desconhecida. Na verdade, penso que esta mistura de sentimentos seja até um privilégio. A palavra privilégio, neste contexto, soa-me um tanto forte, mas traz a sua verdade. Pois... tenho o privilégio de conhecer duas culturas diferentes. Sou brasileira na essência, mas também já me tornei um tanto européia. Quando menos espero, surpreendo-me com características acentuadas que antes não possuía. Percebo, então, o quanto estou mudada. Muitos conceitos e alguns usos brasileiros não me agradam mais tanto como antes, assim como, muitas vezes, é difícil lidar com os costumes de um outro país. A mudança existe, com certeza. No entanto, procuro não compartilhá-la. Prefiro mantê-la em segredo, uma vez que, minha visita na pátria amada é algo quase sagrado. A transformação existe e acontece de forma natural. Seria estranho se nunca mudássemos nosso modo de pensar e se não estivéssimos abertos para novos conceitos e ideias. Viver é uma contante aprendizagem e a alteração acontece se assim o desejarmos. O mais importante neste processo de mudança, é a constante verificação (quase policial) com o modo com que deixo-me envolver. A análise é fundamental. Naturalmente há fatos com os quais simplesmente não concordamos e é importante que conservemos nossos valores primordiais. Porém, não é disso que falo. Conceitos, usos e costumes são variados e se apresentam, muitas vezes, de forma estranha aos nossos olhos. Então, é preciso ter muito cuidado para não assimilar a diferenciação das culturas - e principalmente a do país em que vivo - como preconceitos. Seria uma lástima. Penso que, com o passar do tempo, aprendi a lidar com diferenças, procurando sempre enxergá-las por vários ângulos. A crítica é necessária e as interpretações são ilimitadas. No entanto, moldo a dureza de meus conceitos e procuro fugir da uniformidade de meu pensamento.

Beijo para todos!


13 comentários:

Elcio Tuiribepi disse...

Seja bem-vinda então Ilaine, que bom que passou tantos dias com sua família e amigos, com certeza te fez muito bem esse tempo longe da net...
Quanto aos costumes e a cultura tão diferentes não tem jeito, com o tempo você vai assimilando, absorvendo os costumes onde você vive, embora valores sejam coisas mais pessoais de caráter íntimo mesmo, que acredito não mudar seja em qual cultura estivermos...Sei lá, mas aqui no nosso Brasil tem algumas coisas dificeis mesmo de aceitar...rs
O importante é que você pôde rever famíliares e amigos desta sua terrinha de alma e coração...
Um abraço na alma...bjo

lula eurico disse...

Bom te ver de novo postando teus ensaios... ou seja, tuas palavras cheias de cordialidade e de emoção.
E te digo, somos todos um pouco europeus, amiga. Em algum gene ou em algum remotíssimo gesto atávico, temos algo do Velho Novo Mundo. Mas, a história avança e o mundo caminha para a unidade fraterna. É essa a minha esperança. "Não quero pátria, quero frátria", diz o poeta. Ponho nisso a minha alma inteira.

Abraço fra/terno, maninha.

Josselene Marques disse...

Ilaine:

Valeu a pena esperar pela sua volta. Foi com imenso prazer que li o seu texto tão lúcido e imparcial. Parabéns! Você é uma pessoa extraordinária - uma cidadâ do mundo!!

Um abraço bem brasileiro!

eder ribeiro disse...

Bem vindo de volta a sua casa. Que tua alma seja morada para os teus dois lares, europeu e brasileiro, absorvendo e expargindo convivência. Bjos.

Sandra Botelho disse...

É amiga, nosso Brasil ainda carrega muitas dificuldades e coisas ainda tem que mudar, melhorar,
Mas é o nosso Brasil, nosso pais amado neh?
Bjos meus.

Anônimo disse...

Vivendo, apredendo e mudando, não tem como fugir.
Bjs.

Francisco Sobreira disse...

Ilaine,
Que bom que você retornou à blogosfera, depois de passar férias no Brasil. Obrigado pela visita ao Luzes da Cidade. Um beijo.

Francisco Sobreira disse...

Volto porque me esqueci de lhe desejar também um excelente 2010.

Soninha disse...

Olá, Ilaine!

Que alegria tê-la em terras brasileiras, mesmo que por poucos dias.
A babagem de otimismo e belas recordações que você levou para a Dinamarca, lhe sutentará por longos dias, com certeza.
Levou, também, a imensa saudade, mas, este sentimento é digno dos que amam.
Com referência às mudanças que temos de sofrer, por conta de morarmos em outra cidade, estado ou país, são necessárias e todo conhecimento adquirido é manancial de bençãos. Afinal, já dizia Einstein, "toda mente que se abre a um novo conhecimento jamais voltará ao seu tamanho original"...E é isso o que aconteceu com você. Seria ilógico você se manter a mesma Ilaine dos tempos de Brasil, tendo passado tanto tempo na Dinamarca.
Isto é uma benção, amiga. Quantos gostariam de ter esta chance.
Desejo que 2010 seja um ano bem feliz, cheio de trabalho, de projetos, de sonhos realizados, de saúde e prosperidade, para todos nós.
Seja bem vinda!
Muita paz! Beijosssssssss

Paula disse...

Ilaine, amiga! Um ótimo 2010 pra vc tb! Td de melhor! Que essa visita à pátria querida tenha renovado suas energias (acredito que sim). Beijo!

Claudia Liechavicius disse...

Ilaine.
Que bom ter passado uns dias no Brasil. Voltar para casa (num país diferente) é sempre difícil. Mais difícil ainda é deixar as raízes para trás.
Bj
Claudia

Berê disse...

Que bom ler o que você escreve! Fico imaginando tudo isso que escreveu, a sua viagem, suas impressões, a mudança interior... Isso tudo eu vejo num lindo filme. Quem sabe, um dia, você não escreve um roteiro? Maravilha!

Katia De Carli disse...

Minha querida Ilaine,

Bem feito para mim manter-me tanto tempo ausente... não soube que estava no Brasil. Paciência!
Continuo ausente... da vida, daqui...
Quando penso que as coisas vão melhorar, outras aparecerem, e mais outras... é a parte que me cabe deste latifúndio. Mas um dia hei de encontrar-lhe em Copenhague, ou quem sabe em Trier?
Saudade de tudo isso aqui, das pessoas (principalmente), das palavras, do afeto.
Obrigada, do fundo do coração, por não desistir de mim.
Um grande e saudoso beijo