sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Cristais

O telhado lacrimeja. Será chuva? Não, é a neve que está derretendo. Sua beleza nívea ainda ofusca meus olhos. De silenciosa passou a falar. Os pingos que caem parecem esconder vozes... Ou palavras, palavras lavadas e leves que caem do telhado. Eu recolho algumas na palma de minha mão, mas de tantas... já enchi uma página de poemas fluidos. Agora a neve está molinha e parecem favos – favos alvos. Ela está fraca e se esvai como uma nuvem que se perde no infinito. A coisa alva que cobre o mundo voltará, quem sabe, somente depois dos ciclos. Coisa branca, o que é? Ela tem um condimento mágico e enfeita tudo com seu frio magistral e com seus cristais unidos. Ao olhá-la, o pensamento cria asas, adquire espaço e liberdade. Neve é luz, é transparência melancólica, tal qual plumas claras que roçam o mundo. E ali ficam a namorar. São carícias. Agora, manifesta-se em gotas, enquanto o sol se espreguiça por sobre as telhas de pedra e escava um espacinho morno...

A neve que tu me deste era um cristal e agora... já quebrou.

Imagem by -crimsonpenguin

27 comentários:

Paulo Francisco disse...

Eu não gosto do inverno (mesmo morando nas montanhas) O seu texto me remete aquela sensação de ossos congelados. Por outro lado, o contexto poético é lindo...
Um abraço quente!

Paula Barros disse...

Ilaine, e os dias no Brasil foram bons?

Fala da neve dando vida e sentimento, fazendo ela viva. Um texto com emoção.

Que o sol possa abrir um lugar quentinho no lugar que o cristal de neve se quebrou.

beijo

Sandra Gonçalves disse...

Lindo seu texto, parece uma tela pintada com palavras...É só fechar os olhos e imaginar...
Bjos achocoaltados

Unknown disse...

Batem leve, levemente,
como quem chama por mim...
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim...

É talvez a ventania;
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento, com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria...
Há quanto tempo a não via!
E que saudade, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
de uns pezitos de criança...

E descalcinhos, doridos...
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
- depois em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!...

Que quem já é pecador
sofra tormentos... enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na natureza...
– e cai no meu coração.


Augusto Gil - Luar de Janeiro, 1909

Abraço e bom fim de semana.

lula eurico disse...

Pelo que leio/vejo, chegaste bem a casa.
Que tudo te seja leve e gracioso como a neve...
Que os teus dias sejam felizes, amiga.

Abraço fra/terno.

vieira calado disse...

Em Portugal só vi neve uma vez!

Foi preciso andar por além Pirinéus

para poder perceber bem,

o seu encanto...

Saudações poéticas

Elcio Tuiribepi disse...

Tuas palavras estão cheias amiga, tão cheias que o sentimento embrenhou-se no frio da neve e por alguns instantes foi se derretendo, até que no final...bom...que o Novo Ano Novo seja mais Novo...muita saúde, paz e harmonia, muitra vida, muita luz e muita coragem, muitos sorrisos valentes, muita fé e equilibrio...
Um abraço na alma
Beijo

ítalo puccini disse...

a escrita que reflete o tempo lá de fora (e talvez de dentro da gente). achei maravilhosa!

Jacinta Dantas disse...

Neve quebrada em espaços abertos para aquecer sentimentos. Assim vou divagando no seu delicado texto.
Por aqui, sol, muito sol aclarando sentimentos.
E por aí vamos, com Neve e com Sol, e com o mesmo desejo: Vida.

Beijo

Dauri Batisti disse...

Há uma força recolhida nestas palavras, a força de quem voltando de um país tropical redescobre - ou quer redescobrir - a beleza de se estar onde se está. O texto é lindo, palavras plumas, leves, carícias, neve que roça nossas páginas na internet.

Beijo

Canto da Boca disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Canto da Boca disse...

Ila, como esse sentimento textual me chegou emotivo. Deve ser a minha fase embrionária... Mas cada palavra sua me escorreu como um sopro, embora frio, mas cheio de sentimentos.

Não posso esquecer jamais meu 1º encontro com a neve, enquanto essa caía fininha por sobre o Porto e eu estupefacta mendava sms aos amigos, pedindo-lhes que fossem às janelas... Sabor igual só quando cheguei aos alpes e me joguei na neve, feito criança em piscina de bolas...


Beijos e carinho!

BLOGZOOM disse...

O seu texto ficou maravilhoso! Uma das coisas que mais me encanta é o cristal! Acho algo lindo.

beijos

Sueli Maia (Mai) disse...

Reabastecer-se para enfrentar as baixas temperaturas. Palavras sempre delicada como cristais e a neve.

beijos, amiga.

Anônimo disse...

Tem gente que tem cheiro de passarinho quando canta.
De sol quando acorda.
De flor quando ri.
Ao lado delas, a gente se sente no balanço de uma rede
que dança gostoso numa tarde grande, sem relógio e sem agenda.
Ao lado delas, a gente se sente comendo pipoca na praça.
Lambuzando o queixo de sorvete.
Melando os dedos com algodão doce da cor mais doce que tem pra escolher.
O tempo é outro.
E a vida fica com a cara que ela tem de verdade,
mas que a gente desaprende de ver.


Bjs amiga!

Anônimo disse...

bonita e sensível crônica, Ilaine. e com o calor que faz no sul, a saudade do frio é imensa. beijo e muita felicidade.

Dilberto L. Rosa disse...

Linda prosa poética, minha cara Ilaine! E para mim, a um tantinho assim da linha do Equador, a coisa toda parece ainda mais distantemente melancólica e cheia da poesia que sabes descrever tão bem...

Feliz 2011, em tempo: afinal, quase brigaste com ele (o tempo) no fim do ano, faça logo as pazes e peça para ele parar enquanto teces estas tão lindas passagens neste espaço virtual de sempre bom gosto!

Abração!

Dilberto L. Rosa disse...

P.S.: Mas e os dias no Brasil, não merecem um belo e sensível 'post'?!

Luis Eustáquio Soares disse...

e é extraordinário que o cristal-neve ganhado tenha se quebrado, porque o começo deixa de ser dado,
pra se tornar o desafio ininterrupto de inventar-se,
dar-se.

beijos

de la mancha

que este ano nos nos faça brotos
pra novos começos

Josselene Marques disse...

Ilaine:

Que texto mais encantador... Você emprega as palavras com uma delicadeza e uma poética impressionantes.
Parabéns, amiga.
Que Deus abençoe você e sua família.
Abração.

eder ribeiro disse...

Até o que é deprimente (o inverno, o frio, a neve),por suas palavras mágicas torna-se agradável. Ilaine, um ano de conquistas. bjos.

Luis Eustáquio Soares disse...

aqui volto, pra sentir o calor de seu blog,
nesses frios,

b
de la mancha

Claudia Liechavicius disse...

Oi Ilaine,
Passei uma semana pertinho de você. Fui à Bélgica e Holanda. Que frio, hein??? Não peguei neve, mas estava muuuuiiiiito frio. Agora estou de volta no calor de 40 graus do Rio.
Beijos
Claudia

Jacinta Dantas disse...

Passando para deixar meu abraço e o desejo de que tenhas uma ótima semana.

bjs e abraços.

Madalena Barranco disse...

Ai, que lindos os cristais de água... A fonte das emoções... Amei!

Beijos

Daniel Hiver disse...

Nenhum desses cristais é exatamente igual a outro. Todos são ímpares. Como as impressões digitais. Como as listras nas zebras.
E nós com nossos sentimentos e nossa forma de ver as coisas...
Nem aqui e em nenhuma outra parte alguém chega sequer perto do que nós somos.
Nem na Dinamarca, nem em Melbourne, nem na Bossoroca ninguém chega nem perto da riqueza que temos dentro da gente.
São neurônios e mais neurônios, lágrimas e mais lágrimas. E risos. E gargalhadas. E livros e discos e pessoas e estórias. E cá estamos. Aqui somos. Indispensáveis. Especiais.

BLOGZOOM disse...

Ilaine, onde está aquele outro blog lindo que voce tem? desistiu?! eu adorava visitar... snifffffffff ...