quinta-feira, 7 de abril de 2011

Para Bruno



Eu, agora - que desfecho!
Já nem penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?
Mário Quintana

Escrevo-te ao sabor de um chimarrão amigo que, tomado a milhas do sul, tem um significado muito especial. A originalidade dessa bebida me transfere para um espaço que um dia foi meu: o Rio Grande do Sul. Esse verde tem um teor de pátria que se mistura ao doce aroma das saudades que por aqui sinto. Vou tomando meu mate sozinha, quase em segredo, mas muito feliz , pois carrego em meu alforje a cultura de minha terra, a que tanto amo. Estou usando a tua cuia, aquela que usaste tantas vezes para fazer um mate bem do teu jeito – forte e quente. Lembro que sorvias diariamente esse chá milagroso e com ele te fortificavas. Eras um gaúcho nato, apaixonado pelas tradições, e te perdias em devaneios com a poesia de tantas letras. Recordo de quando tocavas gaita, eras um amante sensível da música e da dança. Nunca esqueci de nossos passeios, quando segurava tua mão, calejada e forte. Pai, eu trouxe tua cuia na bagagem quando fui viver na Alemanha e agora eu a uso aqui na terra de Andersen. É a recordação mais concreta que guardo, além de tua foto que está na estante de meus livros. Sempre falo de ti para meus filhos e eles lamentam não ter te conhecido - nos deixaste cedo demais... Como vês, Bruno, o tempo flui, desliza como uma brisa que, aliás, não podemos segurar por entre nossos dedos. Agora já vivo tanto tempo na Europa. Tu precisavas ver a lindeza que é este pequeno reinado. Um dia vou descrever os lugares que já tão bem conheço e por onde tantas vezes passei. Tenho certeza que ficarias deslumbrado e feliz se, por ventura, pudesses cruzar estes caminhos. Bem sabes, pai, eu sempre amei o mar, sua beleza indescritível, seus mistérios. E aqui tenho tanto mar...


Imagem by ~valyeszter

16 comentários:

Samaryna disse...

Minha querida Ilaine, que deliciosa crônica, não tem como percorrer os olhos pelos teus escritos e não se emocionar. Do que eu conheço do espiritismo, eu lhe digo que o "velho" Bruno percorre este mesmo caminho, saiba, hoje ele é mar na tua vida. Foi o que eu senti ao ler. Deixo o meu afeto e lhe desejando um fim de semana ótimo.

Benno disse...

Estando distante, não deixo jamais de tomar meu chimarrão. Você consegue erva-mate aí na Dinamarca? Conheci no ano passado a Noruega (Starvanger, Geiranger, Trondheim, Bergen, Tromso, Hoenigsvagen, Flan e a Flansbana entre Flan e Mirsdal, é claro - desculpe se errei algum nome, é que não tenho as devidas letras no teclado) gostei demais. Quem sabe um dia consiga conhecer a Dinamarca também. Beijos

Paula Barros disse...

Ilaine, interessante colocar o nome e depois citar ser pai.

Lembranças, saudades, emoção, histórias de vida.

Um beijo

Loba disse...

saí de um blog onde havia um belo texto sobre a mãe. aqui, encontro o pai. e que ternura vc coloca nas palavras. estas lembranças, certamente, te embalam - porque embalaram até a mim! este falar ao pai é o que eu desejaria falar ao meu, se ainda pudesse. sei que me emocionei, viu?
belo texto, moça! muito belo!

Rafael Castellar das Neves disse...

Surpreendente...gostei muito mesmo!

[]s

dade amorim disse...

Poucas coisas são mais tocantes que as palavras que endereçamos a nossos pais. Esse é um lindo texto, Ilaine.

Beijo beijo.

Claudia Liechavicius disse...

Ilaine, querida.
Sempre tão sensível. Que palavras lindas.
Bj grande,
Claudia

Unknown disse...

Nossa minha primeira vez neste blog a partir do blog um-sentir.... Adorei...
Tbm tenho um blog é http://leiabloguilherme.blogspot.com/

Espero que goste...

Elcio Tuiribepi disse...

Oi Ilaine...afff...não tive como não emocionar...
Sua escrita foi além do fisico, foi além de onde você está, chegou lá, na alma de seu pai, que talvez esteja ai, aliás, talvez não, ele nunca deixou de estar aí...
El stá no chimarrão, está nos seus filhos, no seu coração, na sua alma, nos seus pensamentos
Um abraço na alma...sua, dele e de todos ai...rs
Beijo

lula eurico disse...

AS coisas simples dos que amamos ficam impregnadas dessa energia, a saudade dos bons momentos.

Abç fraterno

Canto da Boca disse...

Que beleza de texto, Ila! Sorrio enlevada, e muito grata pela sua sensibilidade.
É que de fato o que nos faz lembrar alguém que amamos, quando ele parte, são totens muito particulares, são simbologias e "referências muito pessoais". Senti uma ligação inquebrantável entre vocês.

Deixo-te beijo, querida amiga e desejos de dias sempre felizes!!

Sandra Gonçalves disse...

Lindo texto...Saudades do pai, quisera eu ter esse sentimento.meu pai não se fez digno dele.
beijos achocolatados

Barbara disse...

O mar daí te enfeita o dia mas não te preenche a alma
Porém que bela a tua manifestação de saudade!
Arriba Guria Boa!

guru martins disse...

...inclusive
o mar das
lembranças
vivas...

bj

Mirys Segalla disse...

LINDÍSSIMO!!!!

Ila, é tocante o seu texto!

Eu também perdi alguém muito querido e já fiquei com vontade de escrever uma "carta" assim... como se a pessoa pudesse ler.. mas acho que ainda não estou preparada.

Bjos e bençãos.
Mirys
www.diariodos3mosqueteiros.blogspot.com

Anônimo disse...

Ilaine,
Tuas palavras sao tao lindas e suaves q faz vir suspiros no meio da leitura.
Parabens por tamanha beleza que consegues transmitir.
Abs,
Juliana